Terapia de casal: nas suas mãos

- Tiraste o frango do congelador?

- Não me disseste para tirar o frango.

- Claro que disse, tu é que já não me ouves. E mesmo sem ouvir não podias simplesmente ter pensado no que iríamos jantar hoje?

- (silêncio, virando costas) Nunca sou eu que trato disso. Não tenho culpa que o dia te tenha corrido mal.

- O que estás aí a dizer?!

(Silêncio)

- Ouviste??? Perguntei-te o que estás a dizer! Como é possível que não entendas o meu cansaço? Sonho com a hora de vir para casa, e de podermos estar finalmente os dois juntos e bem. Como é possível que não me compreendas, ao final de todo este tempo?!

- E tu, como é possível que não me compreendas?!

 

Este é um tipo de diálogo frequente nos casais que acorrem a sessões de terapia. Por vezes são muitos os anos de insatisfação, de crise continuada, de conflito, de afastamento, de discussões prolongadas e sem resolução aparente. Vemos o que foram juras de amor eterno e sonhos prometidos transformar-se em dias cinzentos, e perguntamo-nos o que foi feito de nós.

No entanto, há esperança, mesmo para casais com problemas graves e prolongados no tempo. Um estudo realizado por Andrew Christensen e publicado no daily science do mês de Abril mostra-nos que mesmo os casais com altos níveis de insatisfação crónica melhoram significativamente com a terapia. Neste estudo participaram 134 casais em terapia que frequentaram um programa de terapia de casal que incidia sobre dois aspectos: as mudanças positivas, incluindo melhores formas de comunicar; as reacções emocionais dos dois elementos, sendo trabalhada a compreensão e a sensibilidade. No final do programa, dois terços dos casais mostraram melhorias significativas, que na sua maioria se mantiveram ao longo dos anos.

O factor decisivo, indicam os autores, é o comprometimento mútuo em terapia. Ou seja, para que haja melhorias reais os dois têm de estar fortemente comprometidos em mudar a sua relação e estarem dispostos a trabalhar nesse sentido.

Nos dias de hoje, e tendo em conta as profundas transformações sociais a que assistimos, viver em casal pode parecer uma odisseia. As crises não são só económicas, políticas e macrosociais, são também familiares. Quantas vezes já se sentiu perdido pelo caminho, se sentiram perdidos pelo caminho? Quantas vezes parou, e pensou: que relação é esta? O que é que eu quero de uma relação? Que história é a nossa? O que é que eu quero construir? O que nos impede de termos a relação que sempre desejámos?

Na verdade, nada. E às vezes é possível que este desejo se concretize com pequenas mudanças, que tantas vezes provocam grandes mudanças. A vida em casal não passa a ser um mar de rosas, conhece alguém que consiga (e queira!) viver sem nenhum conflito? No entanto podem ser retiradas algumas pedras do caminho que permitam encontrar novas vias, e outras antigas já esquecidas. A relação de casal é uma das mais significativas na vida, e há cada vez mais a consciência de que é fundamental promovê-la, melhorá-la, cuidá-la. Somos responsáveis por regar as plantas, dar comida ao cão, ao gato e ao periquito, manter comida na dispensa, acções que são diárias e constantes, mas nem por isso as achamos estranhas ou pouco naturais. E por vezes esquecemo-nos de ser responsáveis por regar a relação, dar-lhe comida, e mantê-la com alimentos suficientes na dispensa para quando a fome aperta, com o argumento de que tudo devia ser natural, idílico, espontâneo – “devíamos ser felizes naturalmente, sem esforço!”. Cada vez mais, felizmente, damo-nos conta de tudo isto, e de como afinal tanto da nossa vida em casal pode depender, no sentido positivo, de nós mesmos. Não nos acomodamos, queremos uma vida em pleno. E ela é possível. Está nas nossas mãos. Está nas suas mãos.

 

 

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